Carta de Brás Cubas a Machado de Assis

Para Machado de Assis,
Primeiramente, antes de começar minha crítica avassaladora a esse autor que tentou reproduzir minha vida. Ou minha morte? Talvez, a vida após a morte, dirijo minha palavra a você, querido leitor, que duvidou da minha capacidade de sucesso. Se você não sabe, leitor, exerci a função de crítico literário, não fui muito reconhecido, pois essa foi mais uma de minhas desventuras que não levaram a nada.
Agora, quero a sua atenção Machado de Assis. Vou enumerar aqui uma sequência de erros e equívocos que cometeu na elaboração da obra “Memorias Póstumas”. O primeiro objeto que merece minha observação é a sua prepotência literária e egoísmo quanto ao estilo. Como pôde escrever uma obra na qual expõe uma vida medíocre e de insucessos, como a minha, para a obtenção do seu próprio sucesso? Com a sua ânsia de escrever bem para agradar não sei quem, provavelmente me inseriu na escola literária errada. Queria eu, apenas, casar, ter um amor profundo, sofrido e romântico. Sim, romântico, Machado. O estilo que tanto criticou, mas que por acaso foi o início de sua carreira e que lançou-te na vida literária. Hipócrita!
E o orgulho? Ah, o orgulho machadiano. Esse deveria ser o nome que intitula os estudos, posteriores a sua vida, da psicologia. Esse orgulho que te fez desejar escrever o marco do realismo, e ainda usando a minha imagem para isso. Só porque você dividiu a história da literatura brasileira, iniciou o realismo no país, presidiu a Academia Brasileira de Letras, foi considerado um dos maiores escritores da língua portuguesa de todos os tempos, não quer dizer que foi uma personalidade maior que eu. Nada se compara ao meu emplasto, Machado. Por acaso você já criou algum remédio para curar uma doença fatal? Não, nem eu. Pois, você me fez morrer antes, antes da felicidade, antes do reconhecimento e de ter filhos. Claro, Machadão – eu queria ter filhos, afinal, você nunca me perguntou nada sobre.
Finalizo, deixando meus pêsames por sua morte, fomos dois homens de sucesso, quais a morte tirou-nos o reconhecimento do trabalho árduo. Você nem tanto, digamos que nós somos lembrados, mas de forma diferentes, um com mais prestígio que o outro.
Por fim, aqui do outro lado, percebo que você não foi tão cruel assim comigo. Deu vida e sucesso a um ser inútil como eu, e hoje, pelo menos, posso ser lembrado.
Pensando bem, minha crítica a você se transforma num gigantesco obrigado.
Ass.: Brás Cubas
 

Reginaldo Faria interpretou Brás Cubas no cinema. (Foto: Reprodução/Globo Filmes)
Resposta de Machado a Brás cubas
Amabilíssimo personagem,
Confesso que não finalizei a leitura de sua carta, pois paralisei no primeiro erro de pontuação. Mesmo assim, desejo sorte em sua carreira de crítica literária póstuma, aproveite bem que tem tempo de sobra, procure corrigir sua gramática e atualizar sua linguagem. Os tempos mudaram, Brás. Fica à dica, parceiro.
Abraço, Machado.

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