A importância de se reconhecer em Ismênia

Ao ler a peça Antígona, do dramaturgo grego Sófocles, conseguimos facilmente nos simpatizar com a heroína homônima. Antígona é uma mulher forte, determinada e corajosa, a qual a lei dos homens não pode intimidar. Isso fica claro quando ela decide ir contra a ordem do tirano Creonte e sepultar seu irmão Polinice com suas próprias mãos.

Quando li a obra pela primeira vez (confesso: uma leitura rápida e obrigatória, visando escrever um artigo para o seminário de teoria literária…), terminei com a impressão de que Antígona merecia muito mais o título de heroína do que seu pai-irmão, Édipo. Nessa primeira leitura, não prestei muita atenção nas personagens secundárias, mas como o livro é curtinho e a vontade de não levar esporro do professor por escrever besteira é grande, decidi ler novamente, dessa vez com mais atenção às minúcias.

Foi aí que realmente percebi Ismênia, a irmã que na primeira leitura não me fez sentir muito mais que um pequeno desprezo por não aceitar ajudar Antígona em seu plano. Relendo a peça, algo novo me incomodou; demorei para entender o que era, mas chegando nestas passagens, entendi: “Sou culpada, se ela nisso consentir; partilhei do ato, e quero partilhar da acusação. […] Oh! Não te envergonhes, na infelicidade, em consentir que eu me associe ao perigo que corres. […] No entanto, o crime, se existe, é de nós ambas!”

Percebi que não dei o devido valor à Ismênia. Ao mostrar-se arrependida, querendo até mesmo levar a culpa no lugar da irmã, a personagem expõe um lado de sua personalidade que não estávamos esperando. Ismênia mostra-se aguerrida. Seu amor por sua irmã foi maior do que qualquer medo, inclusive o medo de perder a vida. Entretanto, o que mais me incomodou – e não um incômodo ruim, mas sim aquele incômodo bom que te põe a refletir – foi me reconhecer nela.

Eu já fui a Ismênia da minha primeira leitura, a Ismênia das primeiras impressões. Por muito tempo, acreditei que o melhor era sempre me resignar e respeitar as ordens dos superiores, principalmente quando estes eram homens. Já fui uma mulher frágil que, mesmo contrariada, não tomava atitude alguma para mudar a situação.

Hoje eu sou Antígona. Hoje, nós, mulheres, estamos cada vez mais Antígona’s. Que nunca mais baixemos nossas cabeças para os Creonte’s, que façamos nossas vozes ecoarem por todos os lugares, de Tebas a Chuí. E que não nos esqueçamos de que, no passado, precisamos ser Ismênias, pois somente assim evoluiremos da mesma forma que a personagem, sobreviveremos e nos tornaremos as heroínas de nossas próprias histórias.

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