A épica camoniana por António José Saraiva
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As epopeias traçam em suas narrações o plano de fundo histórico aos quais os poetas clássicos registraram as tradições e os grandes feitos de suas nações, exaltando seus heróis e seu povo, em um modo geral, utilizando a mais alta capacidade poética de expressão. É assim que Saraiva (1997) a define, na iniciação do capítulo IV do livro Luís de Camões. É óbvio que o historiador e também professor discorrerá de forma mais minuciosa sobre a temática durante todo o capítulo que se segue, mas, provavelmente, esse seja um dos maiores diferenciais do autor em relação a outros nomes, como por exemplo, Massaud Móises; este se torna extremamente prolixo em suas biografias, inclusive quando se trata de Luís de Camões e sua epopeia, em livros como Literatura Portuguesa. Saraiva é ao mesmo tempo conciso e profundo em suas colocações, a ponto de trazer maiores detalhes acerca da obra de um poeta que pouco se conhece da vida particular.
António José Saraiva faz com muita acuidade uma classificação, ou divisão, sobre os poemas épicos que já foram escritos anteriormente à Renascença. As epopeias que foram escritas em um dado momento que as relações étnicas, psíquicas e da natureza ainda estão se desenvolvendo com caráter humano, o historiador classificou como epopeia primitiva. Com base em suas análises, chega à conclusão que esses poemas não detêm complexidade psicológica nos heróis aos quais seus poetas louvaram nas histórias. Como exemplo destas obras primitivas destacam-se os poemas homéricos, a Chanson de Roland e o Cantar de Mio Cid, citando somente obras ocidentais pelo Saraiva. Obviamente os poemas cantados por Homero, na Grécia Antiga, ainda tem o seu prestígio perpetuado ao longo do tempo, considerado, pela maioria,a maiorobra prima épica de todos os tempos. Exatamente por essa enorme predominância, os feitos homéricos.
A segunda classificação do gênero épico feita pelo autor é o que ele define como epopeia de imitação, cujo elemento que possui maior representatividade é a Eneida de Virgílio. Seguramente as circunstâncias em que nascem as epopeias de imitação são completamente diferentes das epopeias primitivas. A Eneida, composta por doze livros ou cantos, podendo ser dividida em duas partes: a primeira imita o assunto de A odisséia; a segunda, imitando A ilíada. Apesar desse teor de fidelidade à epopeia primitiva, existe mudanças categóricas para a construção da imitação, a mais importante delas é a instalação do Estado, em decorrência ao grupo étnico instaurado na época clássica, e junto a essa noção estatal, um senso de coletividade presente nesses poemas épicos. Com exceção da Divina Comédia de Dante, o gênero épico sofreu longa recessão durante a Idade Média, vindo ser ressuscitado mais tarde no Renascimento, se tornando maior obsessão dos humanistas.
A partir desse momento, António José Saraiva começa a trilhar o caminho que chegará n’Os Lusíadas de Camões. Os humanistas portugueses tinham plena consciência da riqueza histórica e do caráter épico que isso traria para Portugal. Por consequente, vemos às figuras de três personagens das letras que, de certa forma, buscavam essa composição épica, são eles: João de Barros, Diogo de Teive e, particularmente, António Ferreira. Entre Barrose Ferreira havia algumas divergências: Barros acreditava que a epopeia deveria cantar como o povo português levou a bandeira de Cristo até os confins da terra; para Ferreira, a epopeia deveria servir principalmente para o enobrecimento da Língua, numa linhagem do amor como símbolo de patriotismo.
Saraiva é muito claro quando afirma que somente essas concepções não foram suficientes para a composição de um poema épico. Essa produção exigiria muito mais do autor que uma defesa nacional, e sim um posicionamento do período que tomava as rédeas da literatura europeia: O Humanismo. O autor afirma isso, obviamente, com base na epopeia do Camões, assegurando que claramente o poeta baseia sua imitação na Antiguidade. Para cada herói português, Camões traçou paralelos com os gregos ou latinos.