15 livros obrigatórios dos últimos 15 anos da literatura hispano-americana
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O jornalista e escritor carioca Sérgio Tavares, colunista da Revista Bula, selecionou 15 livros que são obrigatórios, nas últimas décadas, da literatura hispano-americana. O autor salienta que a lista é de “sugestões, sem qualquer caráter reducionista, que aqui figuram por conta de dois critérios: obras assinadas por autores nascidos em países da América Latina, com exceção do Brasil, e lançadas, em algum momento, por uma editora brasileira”.
Segue a lista agora:
2666 — Roberto Bolaño
Ciente de que seu corpo não aguentaria o prazo do transplante, Bolaño escreveu esse monumento literário de modo a garantir o futuro de seus filhos. Portanto há, em cada escolha de palavra, a preocupação em ser preciso, magistral; e ele consegue. Feito para ser lançado em cinco edições, porém condensado num tomo de quase 900 páginas, esse romance é constituído por microcosmos narrativos distintos que, delicadamente, vão se alcançando. A obra-prima do nosso tempo, embora incompleta; ou, talvez, exatamente por isso.
Alvo Noturno — Ricardo Piglia
Confessando que o meu favorito do Piglia, “Respiração Artificial”, tem mais de 15 anos, de maneira alguma direciono a esse romance uma carga de compensação. Aqui este figura por méritos próprios, tal qual todo título desse autor argentino, que é um dos maiores em atividade. Embalada por um ritmo policialesco, a narrativa parte da solução de um crime para relacionar ficção e realidade, criando condições para Piglia exercer o que mais gosta: analisar a literatura em seu modo de fazer.
História do Pranto — Alan Pauls
Segunda parte de uma trilogia, como informa o autor, sobre coisas que perdemos ao longo da vida, esta cabe às lágrimas. A educação sentimental de um menino de classe média, filho de pais divorciados, que, por meio de um olhar pueril, relaciona-se com um país também divorciado, vítima do radicalismo político. Pauls constrói, com igual mestria, a psicologia dos personagens e o panorama histórico, a fim de compactuar com um passado que insiste em não ser superado.
Formas de Voltar Para Casa — Alejandro Zambra
O virtuosismo técnico de Zambra está na assombrosa capacidade de verter em palavras a amplitude do olhar, seja na varredura do mundano ou na do íntimo. O resultado é uma narrativa sofisticada, afeita a um tipo consistente de metalinguagem na qual o que não é literatura é absorvido pela trama. Nesse romance estupendo, o tom é político, a memória coletiva de uma nação sob o efeito atordoante de uma ditadura militar. Um relato sentimental sobre uma geração que não tinha ideia de que seus pais eram desaparecidos, enquanto brincavam eles próprios de se esconder.
Rostos na Multidão — Valeria Luiselli
Montado em pequenos blocos narrativos, esse romance fascinante é uma ode à literatura enquanto plano de encanto e de fuga. Uma dona de casa, sufocada pelo matrimônio e pela maternidade, tenta escrever um romance num tipo de senha para resgatar a energia de um passado e reverenciar a um poeta obscuro. Assim, cria-se um jogo em que o desejado vence gradualmente o desejo. De fato, Luiselli já merecia todos os louros pela melhor definição do que é ser escritor e ter filhos.
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O Fundo do Céu — Rodrigo Fresán
Um romance divertido que faz um tributo aos cânones da ficção científica, sem ser de ficção científica; que fala sobre amor na juventude, sem ser piegas o suficiente. Fresán é conhecido por incorporar às suas tramas uma pluralidade de temas e de estilos, a fim de perseguir uma literatura que esteja na biblioteca e também nas páginas de jornais. Manipular o tempo é o barato desse livro.
Pássaros na Boca — Samanta Schweblin
Herdeiros legítimos do realismo fantástico, os contos que compõem essa antologia expõem o tecido cotidiano à incidência abrasiva do insólito, da estranheza cultivada a níveis perturbadores. O caso é que, devido ao quilate narrativo, tal efeito transformador acaba por revelar a miséria humana, sobretudo no trato das relações interpessoais em que a crueldade exerce uma função aliviante. Schweblin toma emprestado qualidades de uma tradição literária, tornando o mágico em trágico.
As Noites de Flores — César Aira
Em certa entrevista, Aira confessou que seu processo criativo se resume ao improviso. Bem, essa é uma definição que cai bem a esse romance, no qual um casal de idosos, acertados pela crise econômica, começa a vender pizzas de porta em porta. Tudo ocorre dentro da normalidade, até que, numa virada brusca de enredo, algo muito próximo ao nonsense abraça a tudo. Se realmente a trama advém de um exercício de improviso, isso só torna esse livro mais notável.
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Delírio — Laura Restrepo
Tal o efeito da explosão de uma bomba acionada a mando de Pablo Escobar, esse romance é construído através do turbilhão de estilhaços. Um homem adentra um quarto de hotel, depois de uma curta viagem, e encontra sua mulher “aterrada e aterradora”. Esse é o gatilho para o transcorrer de uma prosa caótica, na qual se mesclam realidade e ficção, voz do narrador e do personagem, digressões e alternâncias temporais; tudo a cargo de se discutir o painel sociopolítico colombiano.
Flores — Mario Bellatin
Um aviso aos leitores: todas as flores, que referenciam esses contos, são venenosas. Suas cores maviosas e pequenezas escondem um poder de impacto fatal. Belattin é genial ao concentrar, em narrativas curtas e secas, uma malha de contundências e perturbações. Esquisitices, compulsões, crianças mutiladas; o avesso da vida, da vida ilustrada num comercial de margarina, comanda o eixo temático. Um livro que, ao se chegar à última página, é impossível sentir-se indiferente.
Um, Dois e Já — Inés Bortagaray
As dimensões esquálidas desse livro ludibria o leitor que, desprevenido, embarca numa viagem familiar relatada por uma menina, cujo roteiro compete ao mundo doméstico das relações fraternas encenadas no interior do carro, e ao todo exterior que corre em borrões infindáveis pela moldura da janela, fantasmas insidiosos da ditadura vigente. Uma pequena joia literária.
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Falar Sozinhos — Andrés Neuman
Diferentes tonalidades de silêncio, por muitas vezes, carregam maiores significações dos personagens desse romance que suas próprias falas. Um pai doente leva o filho numa última viagem de caminhão, a cargo de lhe implantar memórias boas do presente e do seu próprio passado. Enquanto isso, a mulher, desconcertada pela iminência do luto, transfere a emoção da perda para aventuras sexuais e para a literatura. Neuman encontra uma delicadeza nevrálgica nesse destino com a morte.
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Purgatório — Tomás Eloy Martínez
Depois de trinta anos, em que a procura incessante tornou-se num pesar corrente, uma mulher reencontra o marido, desaparecido durante o período da ditadura militar argentina. Ocorre que, ao contrário dela, agora sexagenária, ele não envelheceu um dia sequer. A cerne do absurdo, do passe livre para a tortura institucional, para mortes em nome de uma nação, resgata elementos da literatura fantástica, costurando, com sutileza, uma trama que contém retalhos de realidade e de ficção. A incapacidade de mudar a história não impede de reinventá-la.
A Festa do Bode — Mario Vargas Llosa
Mais explicações para figurar aqui um livro do Nobel de Literatura seria tolice. Contudo há, nesse romance, uma alta voltagem histórica que se distribui em favor da ficção, sem que prevaleça o didatismo e as condensações. Pelo contrário. Ao ter, no pano de fundo, o retrato do ditador Trujillo, Vargas Llosa eletrifica os planos narrativos em que habitam os personagens inventados, oferecendo ao leitor uma história que cabe na História, mas não se acomoda a ela.
de reinventá-la.
O Boxeador Polaco — Eduardo Halfon
Essa foi uma leitura recente e, devido ao impacto que me causou, teve força para integrar a relação. A arte dos contos de Halfon pertence a uma escola que recorre à memória não para fazer ficção, mas para compor uma outra memória onde os fatos se ajustam à literatura. Destaque para a narrativa que empresta nome ao livro, onde um avô, de maneira um tanto lúdica, relata para o neto como foi salvo do campo de concentração devido ao talento do tal boxeador. Descrito com tamanha sofisticação e segurança, o leitor, decerto extasiado, não se importa se vê realidade ou não.
Fonte: Sérgio Tavares, na coluna “Livros”, da Revista Bula.
Imagens: Reprodução/Internet
Da Redação.