Uma análise sobre o famigerado “novo acordo ortográfico”, por Sergio de Carvalho Pachá

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AINDA A NEOCACOGRAFIA DE 2009 E A UNIDADE DO PORTUGUÊS

Estou persuadido de que, deste lado do mar, a neocacografia acadêmica serviu apenas a duas castas de indivíduos: aos pavões da Academia Brasileira de Letras, que sentiram suas pessoinhas bafejadas pela nauseabunda notoriedade que a propaganda neocacográfica lhes angariou, e aos editores de livros, que rapidamente imprimiram pilhas de dicionários escolares e outros livrecos didáticos na neocacografia acadêmica, para vendê-los ao Ministério da Educação, que os compra aos milhares e os distrIbui pelas escolas públicas do país. Mas eu não conheço um único professor de português merecedor de meu respeito que esteja de acordo com esta congérie de regras ridículas, incongruentes e arbitrárias que nos enfiaram goela abaixo, sob a fraudulenta alegação de que se estavam a unificar as ortografias do Brasil e de Portugal.

Fique bem claro, porém, que  ESTOU A FALAR APENAS DE ORTOGRAFIA, vale dizer, de convenções gráficas (boas ou más), passíveis de serem adotadas  e alteradas, ao talante da sociedade que as emprega para representar por escrito a língua que fala. Já a escolha vocabular, a construção das frases, a pronúncia dos sons da fala, quer em vocábulos isolados, quer em frases inteiras, são fatos de linguagem que se sobrepõem a quaisquer determinações dos poderes constituídos. Somente os usuários de determinada língua podem modificá-los e, ainda assim, inconsciente, impessoal, coletiva e lentamente.

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Por outro lado, as diferenças regionais ou nacionais, no modo de falar e escrever, nada têm a ver com a unidade superior do idioma: assim como, sem embargo das diferenças de pronúncia, entonação e escolha vocabular, tanto um transmontano quanto um ilhéu da Madeira falam português, assim também, apesar das diferenças na pronúncia brasileira  (que é, basicamente, a pronúncia do português europeu na época do Descobrimento), no léxico e na sintaxe, no Brasil se fala e escreve a mesma língua que em Portugal.

Unidade de língua não é o mesmo que uniformidade no modo de falar e escrever essa língua. E a idéia de que se pode impor por decreto ou por campanha publicitária uma uniformização no modo de pronunciar o R em Lisboa e no Rio de Janeiro, por exemplo, ou na colocação dos pronomes átonos na frase, só pode ocorrer a alguém que ignore TUDO acerca da natureza das línguas, de sua história e de sua evolução.

[03.06.2012]

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Publicado originalmente em sua conta pessoal do Facebook (acesse-a aqui). Publicação autorizada.
Sérgio de Carvalho Pachá foi, durante muitos anos, lexicógrafo-chefe da Academia Brasileira de Letras.

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