Paulo Coelho e a polêmica sobre o sucesso

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Parece existir um senso comum de que qualidade da produção literária deve estar necessariamente desvinculada de grande sucesso. Aquele sentimento existente de artista marginal que se sobrepõe às próprias mazelas e produz obra excepcional. Mas, mais do que isso, se recusa a colher os louros do próprio trabalho e aceitar o sucesso. Talvez essa seja uma das possíveis explicações do preconceito existente contra o autor do livro brasileiro mais vendido e que está no Guinness Book como o autor mais traduzido no mundo, o escritor Paulo Coelho.  

Nascido em 1947 no Rio de Janeiro, Paulo Coelho foi diretor e autor de teatro antes de se dedicar à literatura. Porém, a atividade pré-literária que o tornou famoso foi a parceria com o cantor e compositor Raul Seixas (1945-1989), um dos ícones da contracultura brasileira. Sucessos como “Eu nasci há dez mil anos atrás”, “Gita” e “Al Capone” se originaram desta parceria. Também escreveu letras para outros expoentes da música brasileira como Elis Regina e Rita Lee.

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Paulo Coelho e a polêmica sobre o sucesso
Paulo Coelho durante a posse na ABL. (Imagem; Reprodução/Internet)

Seu primeiro livro, editado por ele mesmo, foi “Arquivos do Inferno” e não obteve nenhuma repercussão. Após percorrer o Caminho de Santiago de Compostela, na Espanha, publicou “O Diário de um Mago” e em 1988 “O Alquimista”, que se tornou o livro brasileiro mais vendido de todos os tempos e o 5º livro mais vendido no mundo. Foi com ele que Paulo Coelho ganhou projeção internacional. O ex-presidente norte-americano Bill Clinton e outras celebridades mundiais foram vistas com o livro. Estava dado o passo para o sucesso internacional e simultaneamente para a rejeição de alguns.  

Mas a rejeição ao autor é predominantemente brasileira – em outros lugares do mundo o autor é altamente aclamado. Já foi publicado por 64 editoras de 59 países. A publicação de seu livro Onze Minutos, lançado em 2003, já havia sido acertada por mais de vinte editoras estrangeiras antes de seu lançamento. Recebeu a comenda de cavaleiro das artes e das letras na França em 1996 onde ouviu do ministro da cultura francês: “Seus livros fazem bem porque estimulam a capacidade de sonhar, nosso desejo de buscar e de encontrar a nós mesmos nessa busca.” Já quando foi homenageado na 60ª Feira Internacional do Livro de Frankfurt em 2008 e convidou o então ministro da cultura para participar, este não compareceu. Seu livro “Veronika decide Morrer” recebeu elogios do consagrado escritor italiano Umberto Eco. O autor também foi inspiração para um musical no Japão e peças de teatro na França. Unanimidades não existem, é claro, mas os números e as críticas comprovam que os brasileiros tendem a ser menos receptivos com a obra de Coelho. Fernando Morais, autor da biografia do escritor, “O Mago”, cita no livro a seguinte frase de Tom Jobim, “Sucesso, no Brasil, é ofensa pessoal”.

Se isso não é totalmente verdade, é uma meia-verdade aparente. Alguns artistas brasileiros que ganham projeção internacional tendem a ser alvos de crítica negativa. Talvez seja o que o também escritor brasileiro Nelson Rodrigues descrevia como complexo de vira-lata. Rodrigues dizia que por “complexo de vira-lata entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo”. Dos principais prêmios que recebeu, poucos, em seu site aparecem apenas 4 de 65, são brasileiros e a metade relacionada a seu empreendedorismo e não à sua obra de fato.

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Paulo, em parceria com Raul Seixas nos palcos. (Imagem: Reprodução/Internet)
 

Os que criticam negativamente o trabalho de Coelho creem em outras questões. Argumentam que sua narrativa é fraca e superficial, que seus textos são permeados por erros gramaticais e que possuem um quê de auto-ajuda. O Phd em Letras Janilto Andrade, publicou o livro ”Por que não ler Paulo Coelho” onde refere-se à obra de Coelho como ”um excitante vulgar procurando qualificar-se como arte sofisticada”. Coelho não responde às críticas à sua obra. Na verdade, ele só responde a críticas negativas quando estas se referem a seus leitores.

A sua eleição em 25 de julho de 2002 para a cadeira 21 da Academia Brasileira de Letras reacendeu a polêmica acerca da qualidade de seu trabalho. Mas sua fama só cresceu: sete anos depois, seu livro “Veronika decide morrer” foi transformado em filme por Hollywood. Convidado a participar da produção, o autor recusou, dizendo que era escritor e não roteirista. Seu último livro, “O Aleph”, publicado em 2011, que aborda a peregrinação como auto-descoberta, é um retorno à ideia presente em “O Alquimista” e tornou-se mais um grande sucesso do autor. Além da dedicação à literatura, o escritor idealizou o Instituto Paulo Coelho, que apoia financeiramente crianças e idosos menos favorecidos.

Coelho ainda faz excelente uso das mídias sociais, interage com seus leitores e fãs e chamou a atenção quando liberou o download gratuito de seus livros em um site da internet e ainda disse “Fiquem à vontade para baixar meus livros de graça e, se vocês gostarem deles, comprem uma cópia física – o jeito que nós encontramos de dizer à indústria que ganância não leva a lugar nenhum”. Sérgio Machado da Editora Record sobre Coelho “Ele virou um craque na negociação e pensa sua carreira sempre três passos adiante” O mago da literatura é também mago do marketing.

A grande questão não é que deva existir uma unanimidade quanto à obra de Coelho, nem aqui se estabelece que quem o crítica o faz majoritariamente por preconceito já que a experiência literária é algo estritamente pessoal. Apenas aborda-se a comprovação de que seu sucesso é um fato e que sua estrondosa projeção internacional gera visibilidade para a cultura brasileira. (Em um país que se destaca prioritariamente por esportistas). Além disso, o escritor costuma ser o carro-chefe da editora em que se estabelece, assim para muitas editoras que tinham necessidade de publicar predominantemente narrativas estrangeiras, por serem mais lucrativas, ele cria a possibilidade de investimento em novos escritores nacionais, que pela lógica anterior não conseguiriam esta chance. O sucesso de Coelho começou na editora Rocco, o lucro obtido por ela com as obras do escritor possibilitou que a editora crescesse e investisse em novos talentos.

As narrativas de seus livros, tidas como simples e o tom de autoajuda presente tornam seus livros mais acessíveis e atraentes aos brasileiros, mas próximos ao seu cotidiano, uma vitória em um país que luta para tornar a leitura hábito entre sua população. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto Pró-Livro em parceria com o Ibope Inteligência em 2011 o número de brasileiros considerados leitores- aqueles que haviam lido ao menos uma obra nos três meses que antecederam a pesquisa – em 2011 era de 88,2 milhões, apenas 50%da população.

O único autor vivo mais traduzido que Shakespeare, com obra publicada em 160 países, traduzida para 73 idiomas, autor do livro brasileiro de maior vendagem de todos os tempos. Esse é Paulo Coelho. Você pode não gostar, mas ainda irá ouvir falar muito dele.

Texto de Bianca Vale para o “Obvious”.


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