Por que ler Borges?

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Jorge Luis Borges (1899 – 1986) é uma daquelas figuras obrigatórias em qualquer estante. Dono de uma prosa elegante e, literalmente, fantástica, o escritor argentino é um dos maiores expoentes da literatura latino-americana, ajudou a criar movimentos artísticos em seu país e devido a preferências políticas, permaneceu a década de 70 no limbo literário, sendo resgatado somente após sua morte. Mas esse já é o final da história e, como diz Gonçalo M. Tavares, nem sempre ele esteve morto.

Borges, nascido em uma família de posses, foi criado sob tutela da avó materna, uma descendente de nobres ingleses. Passou boa parte de juventude na Europa, começou a ler primeiro no idioma de Shakespeare para só depois mergulhar nos livros castellanos. A iniciação tardia na cultura de seu país não impediu que Borges construísse um dos painéis mais interessantes da literatura de língua espanhola. E o começo de tudo foi com o conto “Homem da esquina rosada”, de História universal da infâmia (1935), em que um duelo é presenciado por narrador covarde e tímido, mas que, ao mesmo tempo, idolatra os tipos valentões. Os criollos, gente nascida e criada em terras argentinas, se tornariam constantes em sua obra.

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Por que ler Borges?
Por que ler Borges? (Imagem: Revista Estante/Reprodução)

Quando se fala em excelência borgeana é impossível ignorar a maestria do conto “Pierre Menard, autor de Quixote”, de Ficções. Na história, o dito Menard é tradutor de Cervantes (1547 – 1616) e deseja transformar a obra-prima do escritor espanhol em algo tão original que possa chamar de seu. Não bastassem todos os feitos literários do conto, o behind the scenes de sua criação rende um conto à parte. Borges teve a ideia de escrevê-lo após sofrer um acidente que o deixou entre a vida e a morte. Durante os dias em que esteve no hospital – e depois em recuperação em casa –, o escritor concebeu aquele que seria um de seus melhores contos. A partir desse episódio Borges deixou a poesia em segundo plano.

Cegueira, mas só dos olhos  

Borges nunca escondeu que era um homem conservador. Primeiro apoiou a escalada do peronismo, algo que lhe rendeu severas críticas e até mesmo certo boicote. Alguns anos mais tarde, ele aceitou uma honraria do ditador chileno Augusto Pinochet, o que teria lhe custado o Nobel de Literatura. Claro, que a preferência de Borges por figuras um tanto controversas faz sentido: Francisco Borges, importante personagem na independência argentina, era seu avô, e Manuel Isidoro Suárez, coronel do exército, foi seu bisavô. Ambos são figuras da história da Argentina.

O escritor comenta em seu Ensaio autobiográfico (1970) sobre o passado glorioso de sua família e sobre a importância de Jorge Guillermo Borges, seu pai, a quem chama de “um homem inteligente” e relembra a descoberta de seus livros como evento fundamental em sua formação. Durante os anos de maturidade, Borges relembraria com frequência os tempos de infância, as conversas que tinha a avó sobre literatura e com o pai sobre política e arte.

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Por sinal, as lembranças são vasta parte da obra de Borges, sendo o conto “O Outro”, d’O Livro de areia (1975), um de seus percursos mais interessantes rumo à autoconsciência. No texto, o Borges envelhecido encontra a versão jovem de si mesmo. O diálogo entre os dois é incrível e vale a (re-re) leitura. A questão da memória se tornou mais intensa depois que o escritor sucumbiu à cegueira – causada por uma doença congênita e herdada do pai.

Ainda que a ausência de visão não lhe impedisse de escrever, ele ditava os textos para sua mãe e após a morte dela para uma secretária, Borges retornou à poesia e se dedicou também aos ensaios, criando verdadeiras pérolas como Outras inquisições (1952) e Livro dos sonhos (1971). Na visão de outro mestre, Italo Calvino (1923 – 1985), Borges é o maior narrador do século XX.

E não restam dúvidas de que o escritor argentino é, para dizer o mínimo, um dos autores mais inventivos e importantes de todos os tempos.

Da Redação. (Por que ler Borges?)

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