Me deu saudade da Bahia…
Ao baiano mais importante da minha vida, que hoje completa seis meses que se despediu de todos nós, depois de uma vida de lutas e glórias, como quase todo negro brasileiro caminha nessa jornada.
Salvador é a meca negra no Brasil. Todo negro brasileiro, de qualquer parte do país, teria que um dia pisar na terra que pertence a todos os afros. Esse pertencimento se dá em dois momentos importantes: no turista negro, quando pisa no solo baiano pela primeira vez, é imediata a sensação de nunca ter estado fora daquele lugar; e no nativo é, sobretudo, quando se está distante.
Há nove longos anos deixei a capital da minha vida e fui tentar alguma coisa no sul do país. Nada é muito fácil quando se desce do norte pra cidade grande, como diria o cearense Belchior. Nem tudo são flores, lógico, para qualquer um, mas quando se tem o estigma de ser baiano (embora você seja um nordestino de qualquer outro estado, o povo do sul muitas vezes te alcunha como tal) as coisas ainda se tornam mais labutantes.
Ser alguém ou pertencer a algo ou lugar não deveria, nunca, ser um estigma, mas, como também afirmava o grande artista de Sobral/CE: “conheço o meu lugar”. E nós nos conhecemos, sem dúvida alguma. Sabemos o nosso lugar, e muitas das vezes é na última posição da fila, foi assim que os meus ancestrais foram colocados por brancos europeus, por escravocratas brasileiros… Parece piegas o discurso, repetitivo, coisa e tal, mas só se você, caro interlocutor, for um branco que não entende a história do nosso país, o que eu duvido muito.
O discurso de que o racismo é coisa do passado é bizarro e só se repete por não negros, ou pelo menos não por aqueles que entendem a sua história e não está numa redoma esbranquiçada pela sociedade.
A saudade da Bahia é profunda. A vontade de estar em Salvador, nesse reduto afro, diz respeito ao tal pertencimento. O distanciamento é dolorido e machuca na alma, não menos do que em nossos pais e avôs quando também tentaram desbravar o horizonte em busca de pão, sem qualquer interesse de não mais pertencer.
É difícil escrever um texto como esse, porém foi também difícil não conseguir enterrar o meu avô negro, por estar distante. Foi complicadíssimo vê-lo nos seus últimos dias e não poder correr e abraça-lo. Foi difícil despedir-me dele no aeroporto. Nunca foi fácil, meu caríssimo leitor, nem para mim e nem para você. Mas, repito, o que nos mantém de pé é saber que pertencemos, seja lá ao que ou onde.
Caro amigo Cássio,
Tudo junto. Mameluco, Moreno, como todos nós (diria a mulher do Francis!).
Quem é o “baiano que se despediu” de vós?
Não sendo claro, fico com sua dor, sua ausência, sua Amizade.
Beto.
Caríssimo amigo,
O baiano é o meu avô, que despediu-se de mim em maio deste ano.
Certamente uma das figuras mais importantes desses vinte e poucos anos de vida.
Agradeço as condolências, gentil amigo. Abraços!