Ivan Junqueira, o Recorte Lírico e a bolha intelectual
Quando criamos o Recorte Lírico, em 2015, ainda embrionário e sem grandes pretensões; e com mais corpo, em 2016, já com o blog e os autores atuantes, nosso principal lema era Tirando a literatura dos corredores acadêmicos. Essa frase é muito emblemática para todos nós, pois Rafa Alexander, Aline Ribeiro e eu estávamos justamente na graduação e a forma como as coisas eram conduzidas, na maioria das vezes, desagradavam-nos.
Posso falar em particular das questões que mais me “tiravam o sono”, que eram os mecanismos e a forma como se ensinava (e ensina) literatura na faculdade. Aborrecia-me não por falta de qualidade do corpo docente, pelo contrário, pois tive grandes professores, como Marcelo Brum-Lemos e Verônica Daniel Kobs (que é colunista do Recorte Lírico). O questionamento principal ficava na finalidade do ensino dos grandes autores e movimentos literários.
Claro, é importante frisar que as grandes universidades têm seus objetivos e os cumprem bem, sobretudo em manter boas notas de qualificação dos seus cursos. Isso ninguém pode negar. Mas e a literatura, como fica? Distante… É muito pouco discutida, debatida e popularizada, mesmo. Não que haja uma finalidade ou usabilidade na arte, eu até discordo desse fim. Mas como elemento artístico, a literatura precisa também ser contemplada. Admirada. Mas é uma opinião utópica, sem dúvidas.
Dito isso, preciso falar de Ivan Junqueira e Lucas Silos. Quando Silos ingressou no Recorte Lírico, já com uma cara de blog literário, criou a coluna “Ilustres desconhecidos da poesia brasileira“. Particularmente considero a coluna mais bonita do RL, pois promove justamente a contemplação que nos interessamos. O ilustre, brilhantemente, traz à luz autores como Cícero França e Sérgio Rubens Sossélla, que até então eu desconhecia as existências, muito menos lido quaisquer linhas de suas poesias. Do ilustres, inclusive, vem o pontapé para fazermos a Edição Lucila Nogueira, depois do texto inicial do Lucas Silos sobre a autora:
Além disso, a inserção da coluna nas edições, o que trará ainda mais visibilidade aos autores que ora não são tão lidos.
E o porquê do Ivan Junqueira estar inserido na pauta? Bom, nós fomos ousados o suficiente para trazer o autor, que foi membro da ABL (Academia Brasileira de Letras), na coluna do ilustres, e isso trouxe muitas contestações. “O Ivan jamais pode ser considerado desconhecido”, “Só considera o Ivan Junqueira desconhecido quem não conhece poesia”. Nós entendemos a elite intelectual do país e a respeitamos. É lógico que a massacrante maioria dessa elite conhece a literatura do Ivan, ainda bem. Porém o Recorte Lírico é feito de cima para baixo. E o de cima não é mérito algum. Somente a forma como isso iniciou-se: da Academia para o “povo”, não o contrário.
O Recorte Lírico tem o privilégio de trazer autores como Verônica Daniel Kobs, pós doutorada em Literatura, trazendo pautas bem populares, como quando a professora falou sobre Black Mirror, série da Netflix, ou quando destrinchou os fundamentos da linguagem SEO, tudo na mesma coluna. A Kobs é POP!
Se há algum mérito do Recorte Lírico (que completará cinco anos em 2021) no cenário literário é o de misturar e disponibilizar, aos seus leitores, os conteúdos mais densos e os mais palpáveis. É a forma como prefere enfatizar que o Ivan Junqueira, o grande Ivan Junqueira, no dia que completara 6 anos de sua morte, embora não seja tão desconhecido assim (há controversas), é ilustre. Muito ilustre!
A missão do Recorte Lírico como um todo, seja no blog, revista, ou qualquer outra plataforma que será construída no futuro, nasce do descontentamento das formas de ensino e disseminação da literatura, por isso, repito, tirando a literatura dos corredores acadêmicos ainda se faz necessário. Ainda é urgente. Fazer chegar nomes como o do Ivan Junqueira para leitores ainda em formação é democrático e faz jus ao nosso lema. Só assim poderemos construir, pouco a pouco, junto aos demais blogs, vlogs, grupos, autores independentes e afins um cenário amplo e justo, na melhor concepção da palavra. É preciso tornar a literatura ainda mais justa e interligada. Esse é um caminho sem volta.
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