Barbieland: Qual Delas Você Quer Ser?
“Explorando o Barbieland: De Estereótipo a Símbolo de Diversidade e Empoderamento Feminino”
Em 2023, estreou o filme Barbie, de Greta Gerwig, com Margot Robbie (Barbie) e Ryan Gosling (Ken). Para os acusadores, Barbie representa futilidade e a imagem da beldade é considerada antifeminista e racista. Felizmente, o tipo físico de Barbie não prevalece hoje, quando a moda e a publicidade afirmam que beleza é assumir quem você é.
Na minha infância, as meninas tinham Barbies e outras, menos abastadas, contentavam-se com a Susi. Porém, no meu caso, nem Barbie, nem Susi (assim como a atriz Margot Robbie). Também confesso que odeio cor-de-rosa! No entanto, é impossível negar a importância da Barbie e da cor rosa. Por isso, aqui, usarei essa cor, em todas as imagens.
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Nas coleções da Mattel, e no filme, o universo peculiar da boneca é chamado de Barbieland, inspirando a série Barbie Dreamhouse Challenge, da HGTV. No programa, arquitetos competiam, decorando cômodos da Casa da Barbie. No escritório da Barbie, havia uma mesa com base de aquário. No cantinho do Ken, uma pista de dança surgia magicamente. O closet da boneca era automatizado, permitindo escolher sapatos e bolsas. Mika e Brian Kleinschmidt venceram com o quintal da Barbie, com grama cor-de-rosa e um elegante B de arbustos e flores (Fig. 1).
Depois da estreia, a Mattel lançou a coleção das roupas do filme e Margot Robbie ia a eventos, desfilando o guarda-roupa da Barbie. Conforme o teórico Henry Jenkins (2013, p. 141-142), a transmídia é um movimento de expansão, em que “cada meio faz o que faz de melhor”, objetivando “atrair múltiplas clientelas”.
No filme, a boneca deixa sua rotina mais-que-perfeita, depois de perceber que ela cai facilmente e que, ao tirar o salto, seus calcanhares tocam o chão. Barbie revela suas inquietações em uma festa, com o figurino Golden Dream, acentuando a ironia, no filme. Sendo assim, ela inicia sua trajetória ao abrir mão dos sapatos de salto (Fig. 2).
A fada madrinha não dá escolha à Barbie e, nesse momento, o formato de live-action ganha destaque, afinal, uma boneca abandona o mundo de mentirinha para viver situações no mundo real, oscilando entre ingenuidade e superação: “Se você ama a Barbie este filme é para você. […]. Se você odeia a Barbie este filme é para você” (BARBIE, 2023, grifo nosso). Além disso, em outra sequência irônica, o vilão (Will Ferrell) incorpora as falas dos acusadores de Barbie, pois o objetivo dele é “colocar a boneca novamente na caixa” (BARBIE, 2023). Diante disso, autonomia e liberdade são realçadas, permitindo que Barbie seja “tudo o que ela quiser ser” (MERIGO, 2015).
No quesito moda, depois de 74 anos, algumas alterações foram inevitáveis, para conectar o filme ao público e contexto atuais. No entanto, o longa manteve a identidade e o estilo de Barbie, começando pelas roupas da coleção Barbie Day-to-night, que Margot Robbie usou em um evento coreano (Fig. 3). Na ocasião, a maleta deu lugar à minibolsa que acompanha o tailleur de executiva da boneca, mas o acessório usado no filme adota o estilo de outro vestido de Barbie (Fig. 3). Aliás, notem-se os chapéus, similares, nos dois trajes.
Na cena da festa, Barbie usa dourado, seguindo a tendência de lamê e lurex, de 1970, era das discotecas (Fig. 4).
Apesar das mudanças, a essência é mantida, do mesmo modo que ocorreu nas cenas em que Barbie e Ken usam patins (Fig. 5).
No estilo Western, o clássico preto-e-branco é usado por Ryan Gosling. A roupa de Margot Robbie foi totalmente reformulada, mas o casal combina chapéus, botas e lenços (Fig. 6).
Quanto à moda, um dos trailers mostrava o maiô preto-e-branco listrado, vestido pela boneca, em seu lançamento, em 1959. Parodiando o filme 2001: Uma Odisseia no Espaço, depois que conhecem a Barbie, todas as meninas quebram seus bebês de brinquedo, protagonizando uma revolução (Fig. 7). O Conar censurou o vídeo, alegando “cenas de não-urbanidade, ausência de boas maneiras ou ato violento/inseguro” (FREITAS, 2023).
É justamente por essa ruptura em relação ao estereótipo feminino que Barbie merece ser celebrada. Antes dela, as meninas deviam crescer, casar, ter filhos e cuidar da casa. Contudo, depois dela, as meninas podiam sonhar com o dia em que se tornariam “tudo o que quisessem ser”. De fato, a boneca desfilou incontáveis estilos, representando estereótipos (ballet e sereias), mas também garantindo espaço em ambientes masculinos (Barbie executiva, da linha Day-to-Night e Barbie cowgirl, da linha Western).
Outro exemplo de versatilidade é a Barbie ginasta, ao estilo Jane Fonda. Evidentemente, no século XXI, a preocupação com a diversidade aumentou, e a Mattel associou o slogan “Tudo o que você quer ser!” (MERIGO, 2015) a uma nova linha, a Barbie Fashionistas (Fig. 8), com “170 modelos”(BRITO, 2020). O vídeo (https://www.b9.com.br/61155/nova-campanha-de-barbie-diz-que-as-meninas-podem-ser-o-que-elas-quiserem/) é estrelado por meninas em diferentes profissões: “O que acontece quando as meninas são livres para imaginar tudo o que elas podem ser?” (MERIGO, 2015, tradução nossa). A resposta vem ao final: “Quando uma menina brinca com Barbie, ela imagina tudo o que ela pode se tornar” (MERIGO, 2015, tradução nossa).
Nessa coleção, Barbie e Ken são negros, com vitiligo ou carecas e, assim, as vendas aumentaram. Em 1959, no lançamento, a Mattel vendeu “cerca de 300 mil” bonecas (BRITO, 2020). Já, em 2020, refletindo a diversidade, “as vendas subiram 29%” (BRITO, 2020). Ao longo da história da boneca, “a Mattel estima ter vendido 1 bilhão de Barbies” (BRITO, 2020).
Aliás, desde o início, a Mattel ofereceu a Barbie e o Ken nas versões loira ou morena (Fig. 9).
Portanto, o preconceito não foi criado pela Mattel, mas pela sociedade, que preferia os loiros! Os Estudos Culturais explicam esse fenômeno, argumentando que isso simboliza a tentativa de alcançar o modelo hegemônicas, no que é conhecido como “complexo de colonizado” (MEMMI, 2007).
Barbie foi inspirada na boneca alemã Bild Lilli, uma secretária executiva, criada em 1955, por Max Weisbrodt. A ideia foi da mulher do dono da Mattel, que administrou a empresa, quando o marido adoeceu. Na época, a sociedade não aprovava uma mulher empresária e tudo piorou quando Ruth Handler criou uma boneca em homenagem à filha, Barbara Handler (Barbie), motivando as meninas a escolherem seus próprios destinos.
Dois anos depois, a executiva lançou Ken, inspirado no filho, Kenneth Handler (UMA BREVE HISTÓRIA DE…, 2023), e essa ordem, que privilegia o feminino, invertia a hierarquia imposta pela sociedade patriarcal. Como os pôsteres de divulgação do filme fizeram questão de destacar, “Barbie é tudo” e “Ele é apenas o Ken” (CASTRO, 2023) (Fig. 10):
Então, a questão passou a ser uma só: Qual Barbie você gostaria de ser?
REFERÊNCIAS
BARBIE. Direção de Greta Gerwig. EUA: Warner Bros., Mattel, LuckyChap Entertainment, Mattel Films e Heyday Films; Warner Bros., 2023. 1 DVD (104 min); son.
BRITO, S. A aposta na diversidade leva a boneca Barbie de volta ao topo. Disponível em: <https://veja.abril.com.br/cultura/a-aposta-na-diversidade-leva-a-boneca-barbie-de-volta-ao-topo>. Acesso em: 12 dez. 2020.
CASTRO, M. Com novo trailer de ‘Barbie’, web se diverte comparando personagens femininas aos ‘Kens’. Disponível em: <https://extra.globo.com/entretenimento/noticia/2023/04/com-novo-trailer-de-barbie-web-se-diverte-comparando-personagens-femininas-aos-kens.ghtml>. Acesso em: 1º set. 2023.
FREITAS, B. Conar suspende exibição do teaser de Barbie por “cenas de não-urbanidade”. Disponível em: <https://www.opovo.com.br/vidaearte/cinema/2023/07/09/conar-suspende-exibicao-do-teaser-de-barbie-por-cenas-de-nao-urbanidade.html>. Acesso em: 9 jul. 2023.
JENKINS, H. Cultura da convergência. São Paulo: Aleph, 2013.
MEMMI, A. Retrato do colonizado precedido de retrato do colonizador. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007.
MERIGO, C. Nova campanha de Barbie diz que as meninas podem ser o que elas quiserem. Disponível em: <https://www.b9.com.br/61155/nova-campanha-de-barbie-diz-que-as-meninas-podem-ser-o-que-elas-quiserem/>. Acesso em: 30 nov. 2015.
UMA BREVE HISTÓRIA DE…. Temporada 1, episódio 22. Programa exibido pelo History Channel, em 9 jul. 2023.
Versão reduzida da resenha publicada no blog Interartes: Artes & Mídias, em setembro de 2023.
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